terça-feira, 17 de janeiro de 2012

A ocupação do território 1

Damos início a uma nova secção neste blog, dedicada à descrição de diversos sítios do II e I milénio a.n.e no território envolvente ao Outeiro do Circo, com o objectivo de apresentar uma visão mais completa da ocupação humana nos “Barros Negros” de Beja ao longo deste período.

Cabeço da Serpe (Mombeja) – Povoado em altura da Idade do Bronze

O primeiro sítio a destacar corresponde ao Cabeço da Serpe, ao qual já se fez aqui uma breve menção (diário de campanha 2 de Agosto). Trata-se de um cabeço aplanado de baixa altitude (258 m) onde se observam diversos blocos de afloramento à superfície.

Nas vertentes Oeste e Norte apresenta-se ladeado por um talude bem demarcado ao qual foi adossado uma estrutura circular constituída por grandes blocos graníticos. Apesar de esta estrutura ser referida na Carta Arqueológica de Beja (Ricardo e Grilo, no prelo) como uma provável linha de muralha, julgamos que poderá antes corresponder a uma estrutura de acesso e regularização de caminhos relacionadas com a exploração de uma pedreira que aí laborou até meados do século XX.

Entre os materiais recolhidos pela equipa de arqueologia da Câmara Municipal de Beja contam-se sobretudo cerâmicas manuais com bordos esvertidos e taças carenadas distribuídos pela zona aplanada do topo, que permitiram o seu enquadramento entre o Calcolítico e a Idade do Bronze.

As recolhas efectuadas em prospecções no Verão de 2011 pela equipa do Projecto Outeiro do Circo confirmam os dados já referidos, apesar da escassez de materiais observados.

A proximidade com o Outeiro do Circo (cerca de 1 km) leva-nos a supor a existência de uma fase de ocupação integrada no Bronze Final, que associe os dois povoados a uma mesma lógica de controlo do território.

Considerando que o Outeiro do Circo tem a sua visibilidade nesta direcção (Noroeste) limitada pelos relevos do Cabeço da Serpe, este seria o lugar indicado para instalar um fortim ou atalaia que permitisse o domínio visual para as áreas de planície a Norte e para as zonas serranas a Oeste – Noroeste.

A existência de redes de povoamento que integrem sítios com este tipo de funções associados a povoados fortificados está escassamente documentada no território português durante a Idade do Bronze, mas pode ser referido o caso do Castelo do Giraldo (Évora) que José Morais Arnaud identifica como um possível fortim dependente do povoado da Corôa do Frade (Arnaud, 1979: 87). Um outro sítio também considerado como atalaia é o Cabeço do Cucão (Viseu), localizado fora do âmbito geográfico da nossa área de estudo, mas relevante por ter sido um dos raros sítios deste tipo alvo de sondagens arqueológicas (Senna-Martinez et al, 1993).

No âmbito da possível continuação dos trabalhos arqueológicos do Projecto Outeiro do Circo assumirá especial importância a necessidade de se efectuarem algumas sondagens de avaliação no Cabeço da Serpe de modo a confirmar se este faria parte de uma estruturação do povoamento organizada a partir do Outeiro do Circo, com a emergência de diversos outros sítios com funções diferenciadas na gestão e apropriação do espaço físico.

Bibliografia:
ARNAUD, J. M. (1979) – Corôa do Frade. Fortificação do Bronze Final dos arredores de Évora: escavações de 1971/1972. Madrider Mitteilungen. Heidelberg. 20, p. 56-100.

RICARDO, I. e GRILO, C. (no prelo) – Carta de Património arqueológico e arquitectónico. Beja – Caderno de Mombeja. Câmara Municipal de Beja.

SENNA-MARTINEZ, J.C., NASCIMENTO, A., CARVALHO, A. e ALMEIDA, F. (1993) – A ocupação do Bronze Final do Cabeço do Cucão, Pedra Cavaleira (Silgueiros, Viseu): uma primeira análise. Trabalhos de Arqueologia da EAM. Lisboa. Colibri. 1, p.143-147.

Outeiro do Circo e Cabeço da Serpe. CMP 1:25000, folha 520

Outeiro do Circo e Cabeço da Serpe. Google Earth

Cabeço da Serpe. Vista do Outeiro do Circo, direcção Noroeste.

Muralha Sudoeste do Outeiro do Circo. Vista a partir do Cabeço da Serpe

Cabeço da Serpe. Pedreira

Cabeço da Serpe. Pedreira