segunda-feira, 19 de junho de 2017

Ciclo de conferências "Grandes novidades da arqueologia da região de Beja" - 3ª sessão

A 3ª e última sessão do ciclo de conferências "Grandes novidades da arqueologia da região de Beja" terá lugar no próximo dia 22 de Junho às 21:30 na Biblioteca Municipal de Beja - José Saramago.

Recintos de fossos pré-históricos na região de Beja: um património tão desconhecido quanto notável e ameaçado.
António Carlos Valera
Era Arqueologia S.A.
ICArEHB – Universidade do Algarve

Resumo
As últimas décadas têm vindo a revelar no interior alentejano, e com particular incidência no concelho e distrito de Beja, um notável património arqueológico pré-histórico: os recintos de fossos. Comum em toda a Europa, este tipo de sítio só recentemente começou a revelar a sua importância em Portugal e na Península Ibérica, apresentando hoje o Alentejo uma das mais significativas concentrações.
Um notável património, que, com a sua monumentalidade, desenhos arquitectónicos, natureza contextual e relações transregionais, altera profundamente a visão que se tinha das comunidades pré-históricas que habitaram a região. Centrais na compreensão de um momento importante da evolução humana e das paisagens da região, este património é tão importante quanto desconhecido e por isso desvalorizado e ameaçado. A sua activação social é fundamental para que possa ser protegido e transformar-se em recurso cultural e económico. E o primeiro passo é tornar-se conhecido.

domingo, 18 de junho de 2017

O Fogo e o Outeiro do Circo

A tragédia que se abateu ontem sobre a região de Pedrogão Grande com devastadores incêndios que levaram à morte de 62 pessoas (número em actualização) trouxeram-nos à memória um conjunto de reflexões sobre a "presença" do fogo no Outeiro do Circo, quer de ordem mais científica, quer relacionadas com aspectos do trabalho aí desenvolvidos.

1 - A vigilância do território
Em 2008 ou 2009 (não temos a certeza por não termos guardado registo do momento) fomos surpreendidos pela visita de uma patrulha do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente, da Guarda Nacional Republicana (SEPNA), que igualmente ficou surpreendida com a nossa presença no local (os trabalhos arqueológicos no local iniciaram-se em Agosto de 2008) e que naturalmente nos questionou sobre os motivos que nos levaram aquele sítio. Apesar de não recordarmos os nomes dos militares da GNR, para lhes agradecermos o serviço prestado, o que é certo é que após lhes explicarmos a natureza da nossa presença, estes informaram-nos que o Outeiro do Circo era um ponto de vigilância importante na prevenção de fogos florestais dada a enorme visibilidade que se usufrui a partir do seu ponto mais alto. Mesmo considerando a inexistência de uma torre de vigilância permanente, o facto de se tratar de uma área pouco arborizada presta-se a condições de observação excelentes para a detecção de fogos a grande distância, razões que justificavam a deslocação regular dos militares do SEPNA. Após estas justificações, os dois militares deixaram uma série de recomendações que deveríamos seguir durante a nossa estadia no campo para evitar contratempos relacionados com a prevenção de fogos, mas também sobre questões ambientais, de modo a mitigar o impacto da presença da equipa de arqueologia. E ainda nos deram um contacto telefónico em caso de necessitarmos de auxílio e pediram-nos para nos mantermos atentos a eventuais focos de incêndio para informarmos de imediato o posto de comando. 
Os aspectos que nos foram transmitidos assumem especial relevância por desenvolvermos trabalhos num sítio arqueológico afastado das povoações mais próximas e corrermos o risco de isolamento em caso de incêndio nas proximidades, facto agravado por muitas vezes não dispormos de um transporte em permanência no local. E tais factores lembram-nos os anos de Faculdade em que colegas nossos, participando em escavações arqueológicas de voluntariado em Vila Nova de Paiva (Viseu), se viram quase rodeados por fogos florestais próximos do local que escavavam e acabando mesmo por andarem a prestar auxílio às populações e bombeiros que combatiam os fogos. Fogos esses que consumiram o mato em redor do sítio arqueológico afectando-o directamente, mas sem ter havido vítimas a lamentar.
No entanto devemos acrescentar que desde essa visita nunca mais nos cruzámos com as patrulhas do SEPNA no Outeiro do Circo, esperando que tal se deva a mero desencontro de horários e não à redução destes meios operacionais indispensáveis à prevenção!
Uma outra curiosidade sobre esta situação relaciona-se com a sondagem arqueológica que fizemos no topo do povoado, no local que os militares indicaram como sendo o melhor ponto de vigia, e onde é referido que terá existido uma torre de vigia da qual não subsistem vestígios no local (voltaremos a este tema numa próxima ocasião, por haver referência bibliográfica destes vestígios e de já termos tido outra surpreendente visita de praticantes de geocaching em busca da "torre perdida"!). Os resultados obtidos nesta sondagem não revelaram a presença de estruturas arqueológicas, mas permitiram a recolha de maior quantidade de cerâmicas de épocas mais recentes, nomeadamente romanas e medievais, do que em qualquer outro local do povoado. Poderiam tratar-se dos ténues vestígios que sobraram de uma eventual torre de madeira que permitira exercer vigilância territorial?

2 - A coroa de fogo
Os trabalhos desenvolvidos entre 2008 e 2013 no Outeiro do Circo incidiram num talude da muralha e permitiram a obtenção de diversos elementos sobre a ocupação do espaço, sobre a cronologia ou sobre as técnicas construtivas, entre muitas outras já amplamente difundidas neste blogue e em diversas publicações.
O aspecto mais curioso que estas escavações nos mostraram prendeu-se com a comprovação da existência de uma rampa de barro cozido ao longo da encosta, com cerca de 6 metros de extensão e atingindo em alguns pontos entre 20 a 30 centímetros de espessura! Como já referido em publicações, terá sido necessário um fogo com temperaturas superiores a 600º durante alguns dias para provocar este efeito de transformação do solo vegetal em barro, criando assim uma rampa que julgamos ter tido utilidade prática na consolidação das terras da encosta, conferindo-lhe solidez necessária para edificar a muralha por cima. A realização posterior de trabalhos de geofísica e de prospecção arqueológica ao longo da muralha (com quase 2 km lineares) levou à detecção de muitos outros blocos de barro cozido que nos levaram a afirmar que pelo menos todo o troço Nordeste da muralha teria sido construído com recurso a esta técnica. Julgamos que o impacto criado por esta acção terá sido tremendo, sobretudo se for referente ao primeiro momento de ocupação deste local, e que a sua observação à distância quase daria a ideia de uma "coroa" de fogo a rodear o topo da elevação. Não deixa no entanto de nos surpreender o facto de, aparentemente, este imenso fogo ter sido devidamente controlado, pois parece ter-se restringido à zona da rampa, não existindo vestígios da sua propagação para o exterior ou para o interior do povoado. 
Estas são seguramente questões que só poderão ser resolvidas com a prossecução dos trabalhos arqueológicos no local e especialmente em outros pontos da sua vasta muralha.
Por fim, é de referir que há 2 anos apresentámos uma proposta para uma recriação deste cenário de fogo na encosta do Outeiro do Circo, com uma dimensão muito inferior à situação real que aí deveria ter ocorrido, com o intuito de recriar as condições que deram origem à rampa de barro cozido, através de técnicas de arqueologia experimental e ao mesmo tempo criando uma acção de divulgação destinada a explicar ao público mais genérico aquele que poderá de algum modo ser o momento fundador do Outeiro do Circo. 
Os cuidados necessários para realizar esta iniciativa, as complicações logísticas e os graves riscos que poderíamos correr, levaram-nos a desistir e a repensar uma actividade que em ultima instância poderia rapidamente escalar para algo mais grave, reduzindo à insignificância o objectivo inicial.


sábado, 17 de junho de 2017

Balanço 2ª sessão "Grandes novidades da arqueologia da região de Beja"

No passado dia 8 de Junho realizou-se mais uma sessão dedicada às "Grandes novidades da arqueologia da região de Beja" que desta vez incidiu sobre a Idade do Bronze.
Miguel Serra, responsável científico do Projecto Outeiro do Circo traçou o historial da investigação desde o século XIX até à actualidade, abordando em seguida a visão sobre a Idade do Bronze na região que vingou até recentemente e que foi profundamente alterada e enriquecida com as inúmeras descobertas realizadas neste território na última década e meia.
Por último lançaram-se algumas propostas sobre como valorizar e divulgar este manancial de conhecimento, ilustradas com exemplos de projectos de Educação Patrimonial criados no concelho de Beja.
Os cerca de 20 participantes que assistiram à conferência na Biblioteca Municipal de Beja - José Saramago envolveram-se num longo debate que foi muito para além desta temática específica, lançando-se uma discussão mais vasta sobre a salvaguarda e valorização do património arqueológico da região.
Este ciclo de conferências promovido em conjunto pela Associação de Defesa do Património de Beja e pelo Projecto Outeiro do Circo, com o apoio da Câmara Municipal de Beja, termina no próximo dia 22 de Junho com uma sessão a cargo de António Carlos Valera que nos irá falar das novidades da Idade do Cobre.


sexta-feira, 9 de junho de 2017

Oficinas de Arqueologia Experimental - Olaria pré-histórica - Nelas - Oficina 2 - 3 de Junho

   Apesar de algum atraso, deixamos aqui o registo da segunda sessão das oficinas de arqueologia experimental realizada na Quinta do Vale do Lobo, concelho de Nelas. A sessão principiou com a análise das peças criadas na oficina anterior, que ficaram a secar durante duas semanas. Posteriormente, após uma sessão de esclarecimento de dúvidas, foram explicitados os passos a seguir e os objectivos que se pretendiam atingir com a realização das duas fogueiras.


Sempre com um ambiente de diálogo e discussão interessada, principiou-se a primeira soenga, onde se esperava obter uma cozedura redutora. Deixando para uma segunda fase a fogueira aberta com a qual se pretendia conseguir uma cozedura de cariz oxidante.


   Entretanto, os participantes na actividade puderam desfrutar de um passeio pela quinta, visitando entre outros locais o moinho de água recuperado, e pelo Circuito Pré-histórico dos Fiais/Azenha, passando pelos seguintes sítios arqueológicos: Orca da Palheira, habitat do Ameal, Outeiro do Rato e Orca de Fiais da Telha.


   Finda caminhada e já perto do final da tarde foram abertas as duas fogueiras para se recolher as peças e em seguida analisaram-se as características das cerâmicas cozidas, comparando-as com as das cerâmicas pré-históricas.




   Esta actividade resultou de uma organização conjunta do Projecto Outeiro do Circo/Palimpsesto Lda, em conjunto com o projecto Divulgarq (dinamizado por Luís Laceiras), contando ainda com o apoio do município de Nelas e da Fundação Lapa do Lobo que também financiou a iniciativa.
   Mais uma vez deixamos um agradecimento muito especial aos funcionários da Fundação Lapa do Lobo, por todo o empenho colocado no apoio a esta actividade. Agradecimentos estes que se estendem também aos elementos dos Bombeiros Voluntários de Canas de Senhorim presentes no decurso desta segunda oficina e também a todos os participantes nesta iniciativa.


   Está também disponível na página do facebook do Projecto Outeiro do Circo um álbum fotográfico mais extenso.




segunda-feira, 5 de junho de 2017

Ciclo de conferências "Grandes novidades da arqueologia da região de Beja" - 2ª sessão

A 2ª sessão do ciclo de conferências "Grandes novidades da arqueologia da região de Beja" terá lugar no próximo dia 8 de Junho às 21:30 na Biblioteca Municipal de Beja - José Saramago.
Era uma vez a Idade do Bronze! Investigação, divulgação e educação patrimonial
Miguel Serra
Palimpsesto, Lda.
Centro de Estudos de Arqueologia, Artes e Ciências do Património

Resumo
A planície da região de Beja é fértil em achados da Idade do Bronze desde há muito tempo.
Aqui surgiram evidências de várias necrópoles e estelas que serviriam para as assinalar, para além de artefactos variados como machados, punhais e diversos tipos de vasos cerâmicos.
A investigação realizada durante décadas apontava para a existência de pequenas comunidades dispersas pela planície, mas que se agrupariam para a construção dessas necrópoles ou para a realização de rituais funerários. Viveriam de modo simples aproveitando os ricos recursos naturais da região.
Numa segunda fase, propôs-se que estas comunidades foram tornando-se cada vez mais hierarquizadas, surgindo uma elite guerreira que conduz as populações a um novo modo de vida, abandonando a simplicidade das deambulações nas terras planas, para ocuparem colinas mais altas onde se rodeavam de muralhas e a partir de onde controlavam o território.
A realização de inúmeros trabalhos arqueológicos nos últimos 15 anos alterou e enriqueceu profundamente esta realidade, revelando comunidades muito mais complexas do que julgávamos.

Para além de uma abordagem ao historial da investigação sobre a Idade do Bronze na região de Beja pretende-se também discutir novas formas de divulgação deste conhecimento ao público através do recurso à Educação Patrimonial como forma de salvaguarda e proteção do património arqueológico deste período.